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8/3/12

P@#%/c* do positivismo

"Entre as várias razões que estimularam a recepção de Gramsci no Brasil a partir dos anos 60, uma das mais importantes foi sem dúvida o desejo de levantar a chapa de chumbo do positivismo, que pesava com várias toneladas não só sobre a cultura "republicana" brasileira desde o fim do século 19, mas também sobre a cultura política da esquerda marxista.

Mais conjunturalmente, se tratava de encontrar pontos de apoio político-filosóficos para resistir à onda de marxo-positivismo estruturalista promovida por Althusser e seus discípulos, que vinha tendo grande impacto na França e no Brasil. É nesse contexto que vários pensadores marxistas brasileiros -- entre os quais Carlos Nelson Coutinho tem um papel pioneiro -- vão começar a introduzir o pensamento de Gramsci no Brasil, traduzindo suas obras e utilizando seus conceit os para interpretar a realidade brasileira.

A obra de Antonio Gramsci representa, com efeito, uma das tentativas mais radicais de libertar o marxismo da herança cientificista e positivista que predominou na versão "ortodoxa", tanto da Segunda Internacional (Plekhanov, Kautsky) como da Terceira (Bukharin, Stalin).

(...)Polemizando contra o historicismo, Louis Althusser insistia que Marx era "um homem de ciência como os outros", comparável, em seu terreno, a Lavoisier ou Galileu. Sem o dizer de forma explícita, ele se opunha diretamente a uma tese de Gramsci, que escrevia: "Graziadei [...] coloca Marx como unidade em uma série de grandes cientistas. Erro fundamental: nenhum dos outros produziu uma concepção original e integral do mundo". Essa visão do mundo, a filosofia da práxis, não pode ser decomposta em uma ciência positiva de um lado e uma ética do outro: ela supera, em uma síntese dialética, a oposição tradicional entre "fatos" e "valores", ser e dever-ser, conhecimento e ação, teoria e prática.

Na sua tentativa de reconstrução do marxismo e do comunismo, Gramsci submete a uma crítica radical a doutrina predominante na Terceira Internacional, que tem uma de suas manifestações mais intel igentes no livro de Nikolai Bukharin sobre o materialismo histórico, o Manual Popular de Sociologia Marxista (1922). Trata-se, para o autor dos Cadernos, de uma obra totalmente prisioneira de um conceito de ciência copiado das ciências naturais -- segundo o princípio fixado pelo positivismo de que estas são a única forma possível de ciência. O resultado é que a compreensão de Bukharin da história não é dialética, mas inspirada por um "chato e vulgar evolucionismo" que pretende fazer "previsões científicas" análogas às que buscam as "ciências exatas".

É interessante observar que alguns anos antes Georg Lukács havia criticado o manual de Bukharin em termos bastante semelhantes na revista Archiv für die Geschichte des Sozialismus und der Arbeiterbewegung (1925). É muito pouco provável que Gramsci tivesse lido esse ensaio: simplesmente os dois partilhavam uma mesma orientação filosófica, historicista/dialética, humanista revolucionária e antipositivista, da qual participavam também outros pensadores marxistas como Karl Korsch ou -- desconhecido na Europa -- o peruano José Carlos Mariátegui.

Gramsci praticamente não conhecia os trabalhos de Lukács; e este último só descobriu o marxista italiano a partir dos anos 60. Mas, numa entrevista de julho de 1971 -- pouco antes de sua morte -- para a revista inglesa New Left Review, o filósofo húngaro reconhece que ele, Karl Korsch e Antonio Gramsci haviam tentado lutar, cada um à sua maneira, contra o positivismo e o mecanicismo que o movimento comunista havia herdado da Segunda Internacional. Lukács acrescenta o seguinte comentário retrospectivo: "Gramsci era o melhor entre nós"."

Trechos do texto: "O pensador heterodoxo", de Michael Löwy

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